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Meu Diário
15/07/2020 22h31
O começo de tudo

Quando eu tinha seis anos gostava de ficar olhando pela janela do meu quarto, as pessoas que transitavam na rua, principalmente nos dias de chuva, quando eu não podia sair.

Cada uma tinha características próprias que me faziam imaginar realidades diversas. Um jeito de andar mais seguro podia indicar a felicidade ou a certeza de ser livre...mesmo eu não sabendo exatamente o que isso poderia significar. Já um andar mais acanhado, cabisbaixo, podia ser um prato cheio para imaginar uma história de solidão, um amor platônico, uma existência desesperançosa.

Os rostos, os objetos que levavam, as roupas...tudo era observado para montar um personagem da história que eu criava. Uma moça magrinha, andando rapidamente embaixo de um guarda-chuva, com a cabeça abaixada, escondendo o rosto entre os cabelos, em um instante virava a heroína solitária que buscava em um gato amarelo, driblar um dia atribulado e um chefe insensível. 

Mas no instante seguinte ela cruzava seu andar com um homem gordo, de chapéu panamá escuro e sobretudo preto que passava carregando uma valise. Certamente (pensava eu) chegaria em casa onde duas crianças o receberiam correndo e seu olhar preocupado pousaria sobre uma mesa vazia e uma esposa de olhar compreensivo.

Minha divagação só era cortada pelas gotas de água que tocavam o chão me fazendo enxergar pequenos “patinhos” transparentes ou pelas nuvens que o vento soprava e assumiam formas estranhas. 

Todas as coisas que criava ou imaginava foram mantidas em segredo até que comecei a escrever, aos dez anos de idade, quando os poemas passaram a representar tanto as minhas histórias, onde era personagem de muitos mundos, quanto outros mundos que se aproximaram de mim e por muitas vezes precisei me distanciar e me tornar meus interlocutores, contando suas dores e angústias, porque era impossível deixar de ser a menina na janela. Alguns poemas apenas desabafos, outros foram tantas emoções quantas pude sentir ao ouvi-los...e quantas podem causar a quem os leu. Alguns foram feitos no silêncio da madrugada, outros brotaram de melodias que foram ouvidas uma e outra vez, dando forma ao mundo que os concretizou.

Costumo acreditar que trouxe comigo a marca dos poetas do Mal do Século, cujos versos eram carregados de dores de amores, pois nunca consegui escrever em meus momentos de alegria. Escrevo a solidão, a dor, a perda, a angústia, a paixão doída e desesperada, o amor que não pôde florescer ou que morreu com o passar do tempo, ou mesmo aquele amor recíproco que, por ser tão forte, chega a ser doloroso. Amei, assim, de muitos modos e formas.

Por vezes, pensamento refletiu sobre a poesia "De repente", de Vinícius de Moraes, porque basta um instante, um segundo para que tudo o que temos e somos, se transforme, se perca, mude...e uma criança olhando pela janela se torne poesia. 

 

Cametá/PA, 15/07/20 - 22h30

 

 

Publicado por Gaby Faval
em 15/07/2020 às 22h31
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